Em 40 anos, nunca vi alguém se curar com a força do pensa-
mento. Para mim, se Maomé não for à montanha, a montanha
vir a Maomé é tão improvável quanto o Everest aparecer na
janela da minha casa. A fé nas propriedades curativas da as-
sim chamada energia mental tem raizes seculares. Quantos
católicos foram canonizados porque lhes foi atribuído o po-
der espiritual de curar cegueiras, paraplegias, hanseníase e
até esterilidade feminina? Quantos pastores evangélicos con-
vencem milhões de fiéis a pagar-lhes os dízimos ao realizar
façanhas semelhantes diante das câmeras de TV? Por que a
energia emanada do pensamento positivo serve apenas para
curar doenças, jamais para fazer um carro andar dez metros
ou um avião levantar voo sem combustível? No passado, a
hanseniase foi considerada apanágio dos ímpios; a tubercu-
lose, consequência da vida desregrada; a AIDS, maldição
divina para castigar os promíscuos. Coube à ciência demons-
trar que duas bactérias e um vírus indiferentes às virtudes dos
hospedeiros eram os agentes etiológicos dessas enfermidades.
Acreditar na força milagrosa do pensamento pode servir ao
sonho humano de dominar a morte. Mas, atribuir a ela tal
poder é um desrespeito aos doentes graves e à memória dos
que já se foram.
(Drauzio Varella. Folha de S.Paulo, 09.06.2007. Adaptado.)
O pensamento do autor, sob o ponto de vista filosófico, pode
ser corretamente caracterizado como
(A) compatível com os pressupostos mecanicistas e cartesia-
nos da ciência.
(B) uma visão para a qual a fé na força milagrosa do pensa-
mento apresenta a propriedade de curar doenças.
(C) uma visão holística, de acordo com a qual a mobilização
das energias mentais pode influenciar positivamente orga-
nismos enfermos e possibilitar a restituição da saúde.
(D) uma visão cética no que se refere ao progresso da ciência.
(E) compatível com concepções teológicas emitidas por líde-
res religiosos católicos e evangélicos.