O autoclismo da retrete
RIO DE JANEIRO — Em 1973, fui trabalhar numa revista brasileira editada em Lisboa. Logo no primeiro dia, tive
uma amostra das deliciosas diferenças que nos separavam, a nós e aos portugueses, em matéria de língua.
Houve um problema no banheiro da redação e eu disse à secretária: “Isabel, por favor, chame o bombeiro para
consertar a descarga da privada.” Isabel franziu a testa e só entendeu as quatro primeiras palavras. Pelo visto,
eu estava lhe pedindo que chamasse a Banda do Corpo de Bombeiros para dar um concerto particular de
marchas e dobrados na redação. Por sorte, um colega brasileiro, em Lisboa havia algum tempo e já escolado
nos meandros da língua, traduziu o recado: “Isabel, chame o canalizador para reparar o autoclismo da retrete.”
E só então o belo rosto de Isabel se iluminou.
Ruy Castro, Folha de S. Paulo.
a) Em São Paulo, entende-se por “encanador” o que no Rio de Janeiro se entende por “bombeiro” e, em
Lisboa, por “canalizador”. Isto permitiria afirmar que, em algum desses lugares, ocorre um uso equivocado
da língua portuguesa? Justifique sua resposta.
b) Uma reforma que viesse a uniformizar a ortografia da língua portuguesa em todos os países que a utilizam
evitaria o problema de comunicação ocorrido entre o jornalista e a secretária. Você concorda com essa
afirmação? Justifique.