Na última crônica da série “Bons dias!”, de 29 de agosto de
1889, série na qual um tema são as questões gerais em torno
do curandeirismo, o narrador enuncia:
“Hão de fazer-me esta justiça, ainda os meus mais ferrenhos
inimigos; é que não sou curandeiro, eu não tenho parente
curandeiro, não conheço curandeiro, e nunca vi cara, foto-
grafia ou relíquia, sequer, de curandeiro. Quando adoeço,
não é de espinhela caída*, — coisa que podia aconselhar-me
a curanderia; é sempre de moléstias latinas ou gregas. Estou
na regra; pago impostos, sou jurado, não me podem arguir
a menor quebra de dever público.”
(ASSIS, Machado de. Bons dias! Campinas: Editora da UNICAMP, p. 295, 2008.)
*espinhela caída: designação popular para doenças caracteri-
zadas por dores pelo corpo (peito, costas e pernas), além de
cansaço físico.
Na “profissão de fé”, feita pelo narrador da crônica no parágra-
fo citado, percebe-se
a) a distinção do narrador como uma figura avessa ao curan-
deirismo, por crença na ciência dos filósofos e pensadores
gregos e latinos, o que marca o tom crítico da série.
b) a caracterização do narrador como uma figura superior à
população em geral, o que ecoa o tom analítico das crônicas
dessa série.
c) a repetição exagerada da palavra “curandeiro” (e “curan-
deria”) no trecho, como marca estilística da simplicidade
linguística das crônicas dessa série.
d) a personificação gerada por “quando adoeço (...) é sempre
de moléstias latinas ou gregas”, como marca do estilo em-
polado do narrador nessa série de crônicas.