Texto3
Espalham-se, por fim, as sombras da noite.
O sertanejo que de nada cuidou, que não ouviu as harmonias da tarde, nem reparou nos esplendores do céu,
que não viu a tristeza a pairar sobre a terra, que de nada se arreceia, consubstanciado como está com a solidão, para,
relanceia os olhos ao derredor de si e, se no lagar pressente alguma aguada, por má que seja, apeia-se, desencilha
5 o cavalo e reunindo logo uns gravetos bem secos, tira fogo do isqueiro, mais por distração do que por necessidade
Sente-se deveras feliz. Nada lhe perturba a paz do espírito ou o bem-estar do corpo. Nem sequer monologa,
como qualquer homem acostumado a conversar.
Raros são os seus pensamentos: ou rememora as léguas que andou, ou computa as que tem que vencer para
chegar ao término da viagem.
1 No dia seguinte, quando aos clarões da aurora acorda toda aquela esplêndida natureza, recomeça ele a cami-
nhar, como na véspera, como sempre.
Nada lhe parece mudado no firmamento: as nuvens de si para si são as mesmas. Dá-lhe o Sol, quando muito,
os pontos cardeais, e a terra só lhe prende a atenção, quando algum sinal mais particular pode servir-lhe de marco
miliário na estrada que vai trilhando.
TAUNAY, Visconde de. Inocênci
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