“O Sinhô foi açoitar
sozinho a negra Fulô.
A negra tirou a saia
etirou o cabeção,
de dentro dêle pulou
nuinha a negra Fulô.
Essa negra Fulô!
Essa negra Fulô!
Ô Fulô! Ó Ful
Cadê, cadê teu Sinhô
que Nosso Senhor me mandou?
Ant Foi você que roubou,
foi você, negra Fulô?
Essa negra Ful!”
(Jorge de Lima, Poesias Completas,v.1. Rio de JaneirofBrasita: Aguiar e INL,
1874,p. 121)
“A Sinhá mandou arrebentar-lhe os dentes:
Fute, Cafute, Pé-de-pato, Nao-sei-que-diga,
avança na branca e me vinga.
Exu escangalha ela, amofina ela,
amuxila ela que eu não tenho defesa de homem.
sou só uma mulher perdida neste mundão.
Neste mundão.
Louvado seja Oxalá.
Para sempre seja louvado.”
(idem, p184)
Essas duas cenas de ciúmes concluem dois textos
diferentes de Jorge de Lima. A primeira pertence ao
conhecido poema modemista “Essa negra Ful
segunda, ao poema “História”, de Poemas Negros (1947).
Em relação a “Essa negra Fulô”, o poema “Históri
especificamente, representa
a) a reiteração da denúncia das relações de poder, muito
arraigadas no sistema escravocrata, que colocam no
mesmo plano violências raciais e sexuais.
b) a passagem de uma caracterização da mulher negra
como sedutora para uma postura solidária em relação
à escrava, que explicita as estratégias compensatórias
de que se vale para sobreviver.
c) a permanência de uma visão pitoresca sobre a
situação da mulher negra nos engenhos de açúcar,
que oculta os mecanismos de poder que garantiam
sua exploração.
d) a superação da visão idílica da vida na senzala, graças
a uma postura realista e social, que revela a violência
das relações entre senhores e escravos.