Leia o seguinte trecho do conto “Amor”, de Clarice Lispector.
“Então ela viu: o cego mascava chicles... Um homem cego mascava chicles.
Ana ainda teve tempo de pensar por um segundo que os irmãos viriam jantar — o coração batia-lhe violento,
espaçado. Inclinada, olhava o cego profundamente, como se olha o que não nos vê. Ele mastigava goma na
escuridão. Sem sofrimento, com os olhos abertos. O movimento de mastigação fazia-o parecer sorrir e de
repente deixar de sorrir, sorrir e deixar de sorrir — como se ele a tivesse insultado, Ana olhava-o. E quem a
visse teria a impressão de uma mulher com ódio.”
(Clarice Lispector, Lagos de familia. Rio de Janeiro: Rocco, 2009, p. 21-22.)
a) Em textos de Clarice Lispector, é comum que um acontecimento banal se transforme em um momento
perturbador na vida das personagens. Considerando o contexto do conto “Amor”, indique que tipo de
inquietações o acontecimento narrado acima acarreta na vida da personagem.
b) A frase “olhava o cego profundamente, como se olha o que não nos vê” sugere uma maneira pouco
comum de olhar para as coisas. Explique o sentido que tem esse olhar profundo, a partir dali, na
caracterização da personagem Ana.