Zé Araújo começou a cantar num tom triste, dizendo
aos curiosos que começaram a chegar que uma mulher
tinha se ajoelhado aos pés da santa cruz e jurado em
nome de Jesus um grande amor, mas jurou e não cumpriu,
fingiu e me enganou, pra mim você mentiu, pra Deus
você pecou, o coração tem razões que a própria razão
desconhece, faz promessas e juras, depois esquece.
O caboclo estava triste e inspirado. Depois dessa
canção que arrepiou os cabelos da Neusa, emendou com
uma valsa mais arretada ainda, cheia de palavras difíceis,
mas bonita que só a gota serena. Era a história de uma
boneca encantadora vista numa vitrine de cristal sobre o
soberbo pedestal. Zé Araújo fechava os olhos e soltava
a voz:
Seus cabelos tinham a cor/ Do sol a irradiar/
Fulvos raios de amor./ Seus olhos eram circúnvagos/
Do romantismo azul dos lagos/ Mãos liriais, uns
braços divinais,/ Um corpo alvo sem par/ E os pés
muito pequenos./ Enfim eu vi nesta boneca/ Uma perfeita
Vênus.
CASTRO, N. L. As pelejas de Ojuara: o homem que desafiou o diabo.
São Paulo: Arx, 2006 (adaptado).
O comentário do narrador do romance “[...] emendou com
uma valsa mais arretada ainda, cheia de palavras difíceis,
mas bonita que só a gota serena” relaciona-se ao fato
de que essa valsa é representativa de uma variedade
linguística
detentora de grande prestígio social.
específica da modalidade oral da língua.
previsível para o contexto social da narrativa.
constituída de construções sintáticas complexas.
valorizadora do conteúdo em detrimento da forma.
Ss
VOO