O excerto abaixo, retirado da obra Terra sonâmbula de Mia Couto, é a reprodução do diálogo
entre Kindzu e Surendra.
Antoninho, o ajudante, escutava com absurdez. Para ele eu era um traidor da raça, negro
fugido das tradições africanas. Passou por entre nós dois, desdelicado provocador, só para mostrar
seus desdéns. No passeio, gargalhou-se alto e mau som. Me vieram à lembrança as hienas.
Surendra disse, então:
— Não gosto de pretos, Kindzu.
— Como? Entao gosta de quem? Dos brancos?
— Tambem nao.
— Já sei: gosta de indianos, gosta da sua raça.
— Não. Eu gosto de homens que não têm raça. É por isso que eu gosto de si, Kindzu.
COUTO, Mia. Terra sonâmbula, São Paulo: Companhia das Letras, 2016. p. 15.
Com base no diálogo transcrito e no enredo do romance, é correto afirmar que
A) a conversa ocorre ainda no início da guerra quando Kindzu havia impedido a destruição da loja
do indiano por parte de alguns negros moçambicanos.
B) o romance mostra como o racismo que atravessa a sociedade moçambicana, devastada pelas
guerras, é consequência imediata da colonização portuguesa.
C) o romance pretende apresentar os dilemas que geraram os conflitos entre negros e indianos,
povos de etnias distintas que lutam pelo território moçambicano.
D) a fala de Surendra revela um desejo radical de convívio harmônico entre os diferentes, capaz
de superar noções de identidade baseadas só na raça.