Produzido nos anos de 1943-45, no contexto da Segunda Guerra Mundial, o livro A rosa do povo
solidifica características centrais da poética de Carlos Drummond de Andrade e o consagra como um dos
mestres da poesia modernista brasileira.
Sob essa perspectiva, leia o poema “Consolo na praia” e assinale a alternativa que explicita
corretamente como os traços distintivos do Modernismo de Drummond representam, no texto em análise, o
momento histórico da guerra.
A)
Consolo na praia
Vamos, não chores...
A infância está perdida.
A mocidade está perdida.
Mas a vida não se perdeu.
O primeiro amor passou.
O segundo amor passou.
O terceiro amor passou.
Mas o coração continua.
Perdeste o melhor amigo.
Algumas palavras duras,
em voz mansa, te golpearam.
Nunca, nunca cicatrizam.
Mas, e o humour?
À injustiça não se resolve.
A sombra do mundo errado
murmuraste um protesto tímido.
Mas virão outros.
Tudo somado, devias
Não tentaste qualquer viagem.
Não possuis casa, navio, terra.
Mas tens um cão.
precipitar-te, de vez, nas águas.
Estás nu na areia, no vento...
Dorme, meu filho.
ANDRADE, C. D. de. A rosa do povo. 21. Rio de Janeiro: Ed. Record, 2000, pp. 128-12.
Com métrica irregular e versos brancos, a musicalidade do poema é obtida pela repetição de sons e de
formas sintáticas. Essa simplicidade visa tornar acessível a mensagem politicamente engajada do poema
contra os regimes nazifascistas.
A destrutividade da guerra transparece no poema por meio de imagens que remetem à negação e à
frustração, deixando uma marca de pessimismo não vista na poesia anterior de Drummond, que era
inspirada no otimismo pelos tempos modernos.
A metáfora da nudez na beira do mar remete ao indianismo, revelando um desejo de retorno ao início da
nação brasileira, à era da cultura indígena, quando o ser humano era inocente e ainda não havia a crueldade
da guerra moderna.
Ao longo do poema, a intensidade das perdas e das falhas é temperada por uma sutil ironia (o “humour”,
o que moderniza o lirismo tradicional e abre espaço para uma possível resistência do sujeito perante as
angústias do momento histórico.